Gabriel Garcia Márquez - Divulgação

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Gabriel Garcia Márquez bem sabia o que estava fazendo quando deu início a obra mais importante de sua vida, ganhadora do Prêmio Nobel de Literatura em 1982 e uma das obras mais consolidadas da literatura latino-americana.

Não é possível que não soubesse.

Cem Anos de Solidão é tão bem estruturada, que em mais de 36 horas que li a última página, me senti ainda envolvida e envolta pelo povoado místico e mítico de Macondo e pela estirpe dos solitários e excêntricos membros da Família Buendía.

Daqueles livros que mexem com aquilo que está no profundo e no oculto. Que ousam pisar em sentimentos nunca antes vividos. Machuca o ego, a realidade. Fazem a gente querer que as páginas nunca terminem, porque se terminar, pode doer. Que dão aquele nó na garganta que a gente não sabe se é bom ou se é ruim.

A solidão dos personagens é tão brutal e dilacerante, tão real e palpável, que se arraigou no meu íntimo o desejo de estar só. Como se isso bastasse para seguir os dias. Como se a minha presença me bastasse. E mais do que isso: se arraigou como se eu fosse um dos excêntricos. Como se a solidão já estivesse tão presente, que eu nem sensibilidade e nem tempo tive para perceber como é avassaladora e é parte de mim.

As histórias de tão bem amarradas te fazem viver em Macondo. Te faz irmão dos irmãos Buendía, filhos de José Arcádio e Úrsula Buendía. Te faz participante de uma guerra entre conservadores e liberais, alquimista, prostituta. Te faz coronel, mestre nas magias dos encantos, da sedução e da solidão.

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E te deixam com a impressão de que nunca nesse mundo vai haver história como essa. E não haverá.

A peculiaridade sempre foi terreno fértil para o grande Márquez, que teve os dias findados lá nos idos de 2014, deixando para nós, entre tantas outras coisas, uma grande reflexão da condição de estar só, desacompanhado, isolado em lugar ermo.

Cem Anos de Solidão não é para as leituras apressadas. É preciso memória para seguir a árvore genealógica com parentes de nomes repetidos que voltam de geração em geração e é necessária compreensão para não ficar perdido entre aqueles que tão bem lidam com a morte e com os mortos. Talvez o nó na garganta continue aqui invicto, invencível, soberano, rei de si mesmo, justamente pela morte que insistiu em aparecer em tantas páginas.

Em algum momento ela, a morte, apareceu até viva, vestida de mulher, calçada feito mulher, falando feito gente que muito já viveu e de tanto que viveu acabou assim, suprema, intangível, acima do bem e do mal. E talvez seja ela, combinada com a solidão, como uma sombra, que tenha me feito ficar assim, ensimesmada, com dificuldade de sair de Macondo, com dificuldade de voltar para o que é meu.

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