Uma imagem com maior definição dos chamados "Pilares da Criação", divulgada em 2015 em homenagem à imagem original de 1995. (Hubble/Nasa).

Uma imagem com maior definição dos chamados “Pilares da Criação”, divulgada em 2015 em homenagem à imagem original de 1995. (Hubble/Nasa).

Se o lema da SOUL ART é a tomada de consciência pelo indivíduo por meio da arte como ação libertária e libertadora, não foge aos propósitos deste veículo falar a respeito de astronomia e de seu maior produtor audiovisual e divulgador científico, Carl Sagan, que no final da década de 1970 constituiu uma produtora própria, e em conjunto com a BBC e a PBS, veiculou a série televisiva Cosmos.

A astronomia não deixa ela mesma de servir a um propósito emancipatório. Emancipação talvez não social, mas pelo menos da consciência individual. E aqui há dois fatos correlacionados, intrincados, que devem ser levados em consideração no que se poderia chamar de “estado de consciência cósmica”:

  1. a Terra é um pálido ponto azul já diante de uma selfie da sonda pioneira Voyager, a partir de Saturno, na década de 1990, e, continua sendo ainda, no repeteco da selfie da Terra pela sonda Cassini, 25 anos depois;
  2. diante da escala do universo observável, o tamanho infinitesimal da Terra é imensurável frente ao excepcionalismo da vida, que só ocorre neste planeta, pelo menos segundo os parâmetros do conhecimento científico atual.

Ora, perguntou um dia um cientista durante almoço com três colegas, num refeitório cheio: “onde eles estão?” (ou ainda, “por que o silêncio?”). Tal pergunta, e seu perguntador, deram nome ao chamado “paradoxo de Fermi”.

Há vida extraterrestre? Onde eles estão?

Há dezenas de tentativas de explicação para o fato de que, diante de uma galáxia (a Via Láctea), com seus 100 mil anos-luz de extensão, não há, por ora, sinais científicos nem de vida extraterrena, nem muito menos de vida inteligente.

Não sendo, porém, ausência de evidência equivalente a evidência de ausência, Frank Drake e Carl Sagan estipularam que provavelmente haveria entre pelo menos 1 e 100 mil civilizações inteligentes a cada 100 anos-luz da Via Láctea, com seus, repito, 100 mil anos-luz de extensão.

Aqui o leitor, sem entender muito a proporção do que se passa, poderia perguntar: “como assim?” e, em breves parágrafos, tento esclarecer o que está em jogo.

Saturno visto em imagem reprocessada a partir de fotografia da sonda Cassini (divulgada em 15 de setembro de 2016 pela NASA).

Saturno visto em imagem reprocessada a partir de fotografia da sonda Cassini (divulgada em 15 de setembro de 2016 pela NASA).

Quantas galáxias há no universo observável? Qual é o tamanho da Via Láctea?

Visto que a Via Láctea é infinitamente grande para nossas próprias noções de tamanho, e sendo a Via Láctea apenas mais uma entre 2 trilhões de galáxias apenas no universo observável, como mensurar ou ter uma pequena ideia desses tamanhos, grandezas, extensões ou distâncias?

O primeiro passo consiste, portanto, em considerar que em 1 segundo a luz percorre cerca de 300 mil quilômetros. Por uma questão de noção de grandeza, a Lua está a pouco menos de 1 segundo-luz da Terra (mais ou menos 300 mil quilômetros, portanto). Já o Sol está a 8 minutos-luz de distância da Terra.

No caso da estrela do sistema solar, a aritmética não é tão complexa assim. A continha funciona na seguinte base: cada 1 minuto equivale a 60 segundos, portanto 8 minutos equivalem a 480 segundos. Assim, o Sol está a uma distância de 480 segundos-luz da Terra.

 Imagem da Via Láctea no céu noturno em deserto do Chile, em 21 de julho de 2007, fotografado pelo astrônomo Yuri Beletsky do Observatório Europeu do Sul ou Observatório Paranal (disponível via Wikimedia).


Imagem da Via Láctea no céu noturno em deserto do Chile, em 21 de julho de 2007, fotografada pelo astrônomo Yuri Beletsky do Observatório Europeu do Sul ou Observatório Paranal (disponível via Wikimedia).

Quantas civilizações inteligentes haveria na Via Láctea, segundo Frank Drake e Carl Sagan

Voltando ao que já foi dito acima, a hipótese de Frank Drake e Carl Sagan, na versão otimista para a estimativa de vida extraterrestre, implica que a cada 100 anos-luz da Via Láctea haveria entre 1 e 100 mil civilizações inteligentes (o que multiplicado por mil, dado que a extensão da galáxia é de 100 mil anos-luz, totalizaria a merreca de entre 1 mil e 100 milhões de civilizações inteligentes só em nossa galáxia). Na versão pessimista, haveria apenas 20 civilizações inteligentes em um espaço aproximado de 9 trilhões de quilômetros (1 ano-luz) multiplicado por 100 mil.

Quantas estrelas há na Via Láctea?

O segundo passo, para termos alguma dimensão do que cerca a Terra, consiste em entender que estrelas como o Sol são muito maiores que planetas e que, por isso, em um cenário de entre 100 e 400 bilhões de estrelas apenas na Via Láctea, como não acreditar que em uma porcentagem, mesmo muito pequena, não haveria vida inteligente ou, pelo menos, vida em estado primitivo em alguns desses outros “infinitos” sistemas estelares dentro de nossa própria galáxia?

Alguns elementos e condições para a vida como a conhecemos

O paradoxo de Fermi é fantástico por isso: por que o silêncio interestelar? Onde estão nossos parentes interestelares?

Há uma quantidade enorme de tentativas de resposta ao tal paradoxo de Fermi. Aqui arrolo algumas, direcionadas especificamente a salientar a aparente excepcionalidade terrestre:

  1. a atmosfera de nosso planeta é raríssima;
  2. a temperatura é propícia à vida como a conhecemos;
  3. a específica distância entre a Terra e o Sol é favorável;
  4. a própria formação do sistema solar é muito peculiar;
  5. a posição do gigante Júpiter nos protege.

O papel de Júpiter para a manutenção da vida na Terra

“A Grande Mancha Vermelha” em Júpiter é 3,5 vezes maior que a Terra e consiste de uma tempestade anticiclônica que ocorre há centenas de anos (imagem reprocessada a partir de três fotografias originais da sonda Voyager 1 (tiradas entre janeiro e fevereiro de 1979, NASA).

“A Grande Mancha Vermelha” em Júpiter é 3,5 vezes maior que a Terra e consiste de uma tempestade anticiclônica que ocorre há centenas de anos (imagem reprocessada a partir de três fotografias originais da sonda Voyager 1, tiradas entre janeiro e fevereiro de 1979, NASA).

Quanto ao ponto (5) é preciso entender que não fosse o gigantíssimo Júpiter (origem da expressão inglesa by Jove!) a Terra estaria à mercê de todo tipo de objeto espacial como meteoros, que poderiam rapidamente acabar com a vida no planeta, dado que o ecossistema terrestre exige um equilíbrio delicado de múltiplos fatores (sendo a temperatura apenas um deles). Assim, deve-se reiterar que o gigante planeta do sistema solar é uma barreira para todo tipo de ameaça interestelar.

A Terra é tão minusculamente pequena, mas abriga vida inteligente

Selfie da Terra tirada pela sonda espacial Cassini (12 de abril de 2017). A pequenina mancha cinza à esquerda da Terra na imagem é a Lua (NASA).

Selfie da Terra tirada pela sonda espacial Cassini (12 de abril de 2017). A pequenina mancha cinza à esquerda da Terra na imagem é a Lua (NASA).

Para fechar, volto ao ponto (1) acima, que diz respeito à atmosfera terrestre. A vida na Terra se constitui, sim, de poeira estelar. O próprio “pálido ponto azul” (visto de Saturno!) é constituído de poeira estelar, como nós mesmos o somos. O elemento mais comum no universo, o primeiro da tabela periódica, é o hidrogênio. Como, porém, temos uma atmosfera, cujo elemento principal é o oxigênio, temos que a vida, como a bioquímica consegue explicar nesse momento, depende de uma série de elementos e condições que, numa escala de probabilidade interestelar, é “infinitesimalmente pequena”, apesar de o universo observável, ou mesmo nossa própria galáxia, ser “infinitamente grande”.

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