O cinema estadunidense dos anos de 2010 será lembrado pela sequência de remakes das histórias dos super-heróis popularizados no meio do século XX. Entre essas produções, serão destacadas as de Cristopher Nolan, com seu teor sinistro, como as sequências de Batman e de Superman.

O que poucos lembrarão na análise desse cinema sombrio é sua inspiração nos quadrinhos dos anos de 1980, especificamente os feitos no sexto ano daquela década. Em fevereiro, Frank Miller criaria The Dark Knight Returns, as páginas mais tenebrosas do homem-morcego. Em setembro do mesmo ano, o ocultista Alan Moore daria sequência a essa tendência de histórias macabras envolvendo a espécie antes imaculada chamada super-herói. Em parceira com o ilustrador Dave Gibbons, Moore criava ali a série chamada Watchmen, que em seu enredo arreganharia as entranhas da humanidade, fazendo saltar para fora tanto o bem quanto o mal.

watch1

Watchmen é vista como uma das mais primorosas obras em quadrinhos no que se refere à criação psicológica dos personagens: homens e mulheres que têm em comum os superpoderes, mas divergem em suas qualidades e defeitos. Sim, super-heróis com defeitos – alguns, inclusive, verdadeiros sociopatas e genocidas.

Assim como Superman, que foi criado para ser o homem perfeito em sua benevolência, os membros de Watchmen também foram moldados à perfeição. Mas dessa vez, a referência de perfeição se reflete na exata mimetização dos traços morais e psicológicos do homem contemporâneo na pele de super-heróis. Esqueça a perfeição divinal de Superman.

watch2O mundo das páginas de Watchmen é o mais atemorizante que poderia ser criado: o Planeta Terra dos anos de 1980 e sua iminente hecatombe nuclear. Nesse cenário, o autor coloca homens como Rorschach – um assassino com aprimorado senso moral; Comediante – uma espécie de playboy com um incontrolável desejo sexual; Coruja II – um homem médio, com fragilidades e pouco carisma; entre outros personagens, talhados minuciosamente pela mente observadora e detalhista de Moore.

watch4A exceção quanto à aproximação dos personagens com as franquezas do ser humano fica por conta de Dr. Manhattan. Ele é o oposto disso. Perto da perfeição divina, o personagem seria um modelo dos super-heróis tradicionais, não fosse sua antipatia pelo ser humano e a grandiloquência da raça. É como se Deus – na pele do Dr. Manhattan – não gostasse da humanidade. Ele odeia o mundo que deveria salvar. No evangelho de Moore, quem está para ser crucificada é a humanidade e Deus é quem lava as mãos.

watch3Em busca de salvar o planeta e a espécie humana, Manhattan permite que o mal se debruce sobre os centros consumistas e violentos do mundo e passa a ser o algoz maior da humanidade. O reposicionamento estratégico de Deus para salvar a raça humana é visto como uma traição pelos homens. Veja aí a essência genial dessa batalha Deus x Humanidade, criada por Moore: enquanto Dr. Manhattan organiza o dilúvio, os homens inventam suas represas e seus bunkers para se salvarem. É a batalha entre a humanidade reacionária contra um deus revolucionário. O autor propõe, no campo da Filosofia, que o leitor escolha seu lado.

drManhattan

Quer receber nosso conteúdo?
[popup_anything id="11217"]