Fotografia por Mek

“Estou ouvindo Dan Forrest.

Jubilate Deo… sem palavras…

Como pode haver tanta Beleza

no mundo! Tanta coisa por se

descobrir, sentir e… dividir!”

 

Foi um apelo. Um grito de socorro. Um transbordamento de Beleza que eu precisava dividir antes que o instante escorresse. Não, eu não conhecia Dan Forrest até esses dias. Chegou com sua música feito uma correnteza que impossibilita qualquer reação. Agora, enquanto escrevo, fluo ao sabor dessa lindeza descoberta…

Deus, ou o acaso (como você quiser chamar, querido leitor) foi sábio ao impedir que um texto meu fosse publicado nessa semana. Em meio a uma agitação tão grande de lutas e protestos tão absurdamente justos, não haveria espaço para alheamentos. Todas as estórias devem se calar, quando a História está passando… Seria como a Maravilhosa Cozinha de Ofélia, em plena época de ditadura, ensinando a rechear abobrinhas.

Eu me calei. E sofri com a fealdade desses dias sombrios, com a promessa natimorta de um futuro que não é cobrada pela nação golpeada, mais uma vez “subtraída em tenebrosas transações”. Sofri em casa, longe das ruas, perto de uma desesperança que assiste inerte a um descalabro, com o consentimento de uma parcela inacreditavelmente grande da população. A alguém que dedicou três décadas à educação, a sensação é de uma incompetência contumaz.

Aí, pedi socorro aos meus mestres. Entre os maiores, lembrei-me do imenso Rubem Braga e sua lindeza “Meu ideal seria escrever” em que ele confessa ter querido escrever uma crônica muito engraçada, que a todos fizesse rir… Ora, de um mestre, um discípulo consegue, quando muito, um arremedo. Tentei aprender com o aprendizado dele e me questionei profundamente sobre o que eu mais queria com meu escrito próximo. Muito vinho e oração e concluí: o que eu mais queria mesmo era a Beleza.

Queria escrever um texto muito, mas muito bonito mesmo, que fizesse chorar! O mesmo transbordamento que tive no encontro com o talento de Forrest.

Um texto simples do meu jeito, mas que depois de lido fizesse aquele manifestante cansado e desesperado e choroso retomar sua bandeira rota e… acreditar de novo. Uma coisa inefável dessas que a gente nem consegue explicar, mas que nos faz capazes de mudar o nosso olhar tão cansado.

Uma crônica? (Que importância pode ter o nome?…) que fosse. Mas que tivesse a Beleza suficiente para demover aquele jovem que quer fugir desse país de imundícies…

– Você vai mesmo, embora?

– Eu ia. Mas depois que li esse texto. Sei lá, vou ficar… talvez haja mais belezas aqui.

Meu ideal seria escrever a Beleza única que certas pessoas vão ter na vida e de cujo contato sairão transformadas, que a Beleza deixa marcas indeléveis nas pessoas. Palavras que trouxessem à vida aquela pessoa encantada pela morte, uma redação que amenizasse a saudade e acalmasse a dor de viver distante de quem se ama…

Linhas que desenhassem no céu da memória do leitor um espaço novo, um carinho desconhecido… um texto que fizesse chorar as almas ignorantes da Estética maior:

– Mas por que você chora, então?

– É porque este texto é bonito demais!

O que eu mais queria é a Beleza. Porque eu quase a vi num tempo. Porque ela esteve comigo, bem aqui dentro. E fora… no tempo que viria depois… Na taba em que a felicidade só significa, se pressupuser o coletivo. Mas o temeroso golpe que a arrancou de mim me fez parar também e agora espanta os curumins do nosso quintal! A crueldade e a perversidade de que eu tinha me esquecido parece ter voltado… e eu nada posso contra o amanhecer feio que desceu sobre as janelas dos despanelados.

Não sou o Braga, nem mestre, nem melhor… sou só o que serve. A Beleza talvez não desça nas minhas mãos, mesmo que eu suplique. Não sou a Cecília e a minha dor é insuficiente, nem o Sabino na “Última crônica” sua e nossa para todo o sempre. Sou roceiro, caipira só. Bêbado no bar do bairro, crente no Deus das famílias antigas, à espera de um milagre… que verdades globais talvez suplantem.

– Anjo da anunciação me inspira com a Beleza! Que eu não sei o que dizer, Não sei escrever nesses dias de vergonha em que não me acho…

Que seja assim!

Um fôlego por sete dias!

E a luz da lua será como a luz do sol, e a luz do sol sete vezes maior, como a luz de sete dias, no dia em que o Senhor ligar a quebradura do seu povo, e curar a chaga da sua ferida.”Isaías 30:26

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Sobre o autor

Escritor e Professor de Língua Portuguesa

"Um caipira pleno", como se autodenomina, Valter de Moraes é natural de Biritiba Mirim. Formado em Letras e Pedagogia, dedicou 30 à Educação, lecionando Português e Relações Humanas nas mais diversas realidades do ensino. Atualmente, além de professor no ensino médio e técnico, atua como palestrante, consultor de Língua Portuguesa, escritor e celebrante, ou seja, onde quer que possa exercer e demonstrar seu amor... à palavra.