Artigo de Thiago Almeida é o segundo de uma série que reflete sobre como a loucura e a luta contra manicômios são consideradas pedras no caminho do capitalismo

Exposição inspirada no Holocausto Brasileiro, Hospital Colônia de Barbacena, de Guilherme Bergamini no Teatro Marília: ”Eu sou, tu és, ele é, nós somos, vós sois, eles são.“ (2017)
TRAPAÇA KANSAS CITY
Atualmente, vemos um fenômeno onde os detentores dos meios de produção abarcaram o discurso de “aceitação” das minorias e promovem na propaganda e na grande mídia a retórica do reconhecimento e da identificação dos mesmos.
Porém, como referência no filme Xaque-Mate (2006, Dir. Paul McGuigan), acreditamos que tal persuasão de nicho de mercado, seja mais uma estratégia temporal e cíclica do capitalismo, que vive uma crise importante ao atingir um esgotamento de recursos humanos e bio-naturais, uma forte e desgastante exploração de meios e ecossistemas, ou seja, não promove de fato emancipação do povo ou acesso nas decisões e construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

Clifford Dutra – técnica mista, sublimação sobre papel e aguada de nanquim, inspirada na fotografia de autoria de Luiz Alfredo Ferreira, repórter fotográfico da extinta revista O Cruzeiro (2017)
Assim, acreditamos que a luta antimanicomial também é a luta contra o racismo, contra o patriarcado, contra o preconceito lgbt+, enfim, são lutas contra o capitalismo, contra tantas outras formas de manicomialidades que ora nos exclui ora reclui, permitindo somente participar do jogo como engrenagem, dependendo ou não de um espaço físico para promover sua segregação social.
AFINAL, TUDO É LUCRO?
E pra não dizer que não falamos das flores, queríamos destacar o conceito atual de loucura e traçar um paralelo sobre a participação da indústria farmacêutica e do suposto saber médico. Pois, atualmente observamos que, para a grande maioria dos sentimentos e sofrimentos de natureza humana, há uma hipótese ou afirmação diagnóstica, um CID (Código Internacional de Doença), com isso, há sempre uma oferta de remédio para uma possível “cura”.
Quando a loucura não é excludente, ela é lucrativa! No capitalismo, a conta da exploração sempre fecha, seja por meio das ofertas de espaços de internação que geram lucro, como os hospitais psiquiátricos, as comunidades terapêuticas, enfim, como também a oferta de tratamento medicamentoso de alto custo (ou, na maioria dos casos, os dois).
Também vivemos a investida dos lobistas e financiadores de campanha (ou até mesmo agora, no patamar de deputados e secretários), que são ligados a saúde particular e promovem sucateamento do sistema público de saúde para fortalecer os meios lucrativos que ofertam como “tratamento”.
O SARCASMO DE RAUL
De um modo geral, TODOS nós precisamos entender que a precarização dos serviços públicos é uma estratégia, e não uma condição.

Pintura também de Clifford Dutra, com sublimação sobre papel e aguada de nanquim (2017)
Por exemplo, se quem está no poder (ou quem faz lobby, financiando campanha) e tem ligação com a educação privada ou com os convênios médicos, qual interesse em fazer funcionar esses serviços gratuitos?
Daí, quem mais sofre é o povo, os mais pobres, SEMPRE! Afinal, ao contrário da conta do capitalismo, a conta dos trabalhadores não fecha… Salário baixo, alimentação cara e acesso pago à serviços que deveriam ser essenciais, como saúde e educação (que recentemente, congelaram investimento JUSTAMENTE nessas áreas, por 20 ANOS).
Essa é a verdadeira sangria que precisamos estancar. Reverter a lógica e ocupar os lugares de decisão, seja nos coletivos, nos conselhos gestores, nos movimentos ou até na organização de manifestos, de protestos…
Quando Raul Seixas falava que “a solução é alugar o Brasil”, escancara de forma irônica pra gente, o objetivo real de quem ocupa o poder na lógica capitalista, que é privatizar, vender, acumular, lucrar e pouco se importar com a vida humana, com a desigualdade e a miséria que essas ações irão resultar!
E PRA RESUMIR, SE É POSSÍVEL

Hospital Colônia de Barbacena em 1905: o local deu início ao movimento de luta antimanicomial pelas condições subumanas em que mantinham seus pacientes.
Manicômio não é, somente, um espaço pra reclusão dos ditos “anormais ou desajustados”. Afinal, a sociedade em si não necessita de um espaço físico para praticar a exclusão e exercer exploração e acúmulo.
O conceito antimanicomial trás essa luz e convida ao enfrentamento do padrão normativo imposto, logicamente, pelos que estão no poder ditando leis e organizando a sociedade pra manutenção ao seu privilégio segregador.
Acompanhe as publicações da SOUL ART para ler o terceiro artigo da série.