Anúncio x Conteúdo? Ainda existe jornalismo ou, de certa forma, tudo se tornou publicidade?
Calma! Esse título sensacionalista é justamente pra ilustrar ironicamente a importância que hoje se dá para o impacto das chamadas de matérias ou textos, com imagens, vídeos ou apelos diversos, onde o conteúdo 360° que estamos consumindo no momento é o norte levado em consideração na pauta. Chamadas essas que, ao invés de gerar convite e expectativa para uma leitura completa, deixam o público ali mesmo no título, entendendo que a dinâmica atual da sociedade digital é assim, “passa o olho” e “passa pra frente”.
O que vemos em algum casos no conteúdo jornalístico atual é bem isso, seja qual for a plataforma, destaque pra internet e a expansão das redes sociais, em resumo é assim: a confusão evidente do que é conteúdo ou anúncio publicitário.
A publicidade faz parte do nosso dia-a-dia e está presente em todos os lugares pela consequência do processo de mercantilização, como ferramenta capitalista. Diante desse cenário, quais seriam as possibilidades de compreendermos quando estamos consumindo notícia ou propaganda? A resposta exata pra essa reflexão, depende de uma série de fatores, sobretudo, das características da sociedade de consumo e da compreensão ideológica neoliberal.
Observem! Nos intervalos de alguns programas jornalísticos, por exemplo, é comum a inserção de propaganda de seguros e planos variados, rastreadores, etc… Além, é claro, de produtos e serviços como geladeira em promoção ou oferta de viagens. O que isso quer dizer? Uso esse exemplo pra deixar explícito que, para além da matéria no programa sobre violência e outros fatores urbanos, temos nos intervalos comerciais produtos sobre essas mesmas demandas, e claro, sutilmente alinhados às necessidades mais íntimas do dia-a-dia como uma máquina de lavar ou material escolar, numa construção narrativa onde tudo isso se faz necessário consumirmos em nossas vidas (comprar um carro, necessariamente, demanda de seguro, é como ter uma casa e não comprar uma geladeira, entende?).
Essa relação entre matéria e propaganda gera outro fenômeno, onde muitas vezes não há objetivo de informar, mas sim de vender algo ou criar uma atmosfera social. Ou seja, há margem de somente impactar no título para contextualizar e pronto! No sistema capitalista as pessoas são, somente, consumidores potenciais, público alvo, nicho de mercado, enfim, são tantos os nomes que substituem a “pessoa da pessoa”.
Além disso, nessa lógica atual não nos ofertam só “coisas”, mas também nos “vendem” idéias! Aqui podemos lembrar das fake news, onde o que importa é gerar o impacto, a polêmica, “vender” a formação de opinião, sem o senso crítico do conteúdo, sem o aprofundamento e questionamento do tema em si, aqui o consumidor também é lembrado como eleitor, porém com o mesmo viés do sistema.
Em uma pesquisa feita nos Estados Unidos, revelou-se que a cada 10 pessoas, 7 só lêem o título das notícias, ou seja, essa dinâmica de conteúdos rápidos em textos curtos é uma das causas do desinteresse pela leitura e, assim, cada vez mais consumimos conteúdos visuais como vídeos rápidos e imagens dinâmicas, entre outros apelos com a mensagem ali já explícita.
Vale lembrar que todo formato na comunicação é importante e tem seu papel, o audiovisual é um recurso fundamental e marcante inclusive para o advento jornalístico, porém o que vemos hoje é a banalização, a substituição e confusão dessas tecnologias, num funil onde tudo deve ser entregue “mastigado”.
Somado a correria da nossa vida cotidiana, as pessoas têm necessidade apenas pelo tópico e se sentem contempladas assim, pronto! Quanto menor o título, melhor. Quanto mais imagens e vídeos, maior é a aderência à matéria pela sociedade do espetáculo e do consumo. Isso já se tornou uma tendência moderna em nossa sociedade, justamente no aporte da propaganda. As pessoas preferem cada vez menos ler e cada vez mais ter a informação já processada, assim sem a reflexão e interpretação necessária.
No caso do Brasil temos um agravante importante que é a falta de incentivo a leitura, o alto índice de analfabetismo e o pouco hábito de ler (inclusive, parabéns se chegou até aqui, você está fora da curva), além do sucateamento da educação de forma geral, sobretudo, a educação de base (lembrando mais uma vez: é assustador o número de analfabetismo e abandono escolar no país, ainda mais agravado pela pandemia e pelo fator da desigualdade social).
Essa desinformação devido à falta da leitura contextual, somada à dificuldade na compreensão de textos e notícias, afetam negativamente a sociedade, dando destaque aqui para a baixa qualidade dos conteúdos, somado ainda pela dificuldade de interpretação textual. Isso se explica como as famigeradas fake news caíram no “gosto” da nossa sociedade moderna, afinal elas têm justamente esses fatores apontados e um público específico como alvo: o apelo sensacionalista, mensagem curtas para um “leitor” que não quer saber, entretanto parecer que sabe (por isso vemos tanto a expressão: “vi em um vídeo no whatsapp”, ou então, prints de montagem jornalísticas de péssima qualidade).
Segundo a mesma pesquisa citada, a maioria das pessoas, principalmente nas redes sociais, não consomem os conteúdos de forma completa – o usuário do facebook em média, clica em apenas 7% das matérias sobre política que aparecem em seu feed de notícias – e, mesmo com o baixo nível de aprofundamento, muitos acreditam ter mais conhecimento do que realmente possuem sobre os temas atuais; principalmente aquele público com sentimentos e opiniões mais fortes e odiosas, os famosos (e muitas vezes criminosos) hatters.
Como os usuários de redes sociais têm um comportamento passivo diante das notícias ali veiculadas, a exposição às informações de cunho político nas redes sociais criam simplesmente a ilusão de que há um “aprendizado político”, destacaram assim os cientistas na pesquisa da Universidade da Pensilvânia, concluindo um estudo publicado no Research And Politics.
Enfim, nessa dinâmica da sociedade moderna, onde o conteúdo rápido está diretamente ligado a vida das pessoas em nosso sistema capitalista pela lógica da produção e sem tempo pra nada, a propaganda e o jornalismo são utilizados tanto pra vender como pra informar (ou os dois, juntos e misturados). Assim, publicizar e propagar, mas sem informar e formar, não gera valor, mas preço, empobrece no objetivo que é levar conhecimento e cria a falsa sensação de pertencimento, conhecimento ou reconhecimento, onde na verdade, somos meros consumidores em potencial, a tal da oportunidade de mercado, da oferta x demanda.