As pessoas envelhecem e mudam. Já estamos todos mortos sob certa perspectiva. O que podemos fazer, porém, é guiar nossas vidas e esboçar nossa obra diante do horizonte da morte. O tempo, que só existe como medida anímica do movimento, é o metrônomo daquilo que temos a fazer, quer dizer, a dívida a dever e a pagar. A obra de arte neste viés representa um estágio diante do pôr-do-Sol que se avizinha. De uma parte há o que o pós-adolescente produz mediado por sua teenage angst (“teenguish”), doutra a obra do homem maduro. Mais pungente provavelmente será o labor que cheira à juventude, enquanto o que faz o homem adulto, o pai, tenderá ao reencontro com as raízes, de sabor ponderado, calmo, e sereno. É assim pelo menos que se deve ouvir e encarar a discografia de Hamilton Leithauser e de sua trupe andarilha: do desespero existencial da juventude alcoólica à aparente tranquilidade, de violão na mão, do pai de uma filhinha de um ano.
São já sete álbuns e dez anos desde o primeiro, Everyone Who Pretended to Like Me Is Gone (2002); isto é, sete contando a regravação de Pussy Cats (2006), gravado originalmente em 1974 por Harry Nilsson e produzido por John Lenon.
A ideia então é mostrar como a banda de Leithauser foi aos poucos se distanciando de um estilo mais obscuro e carnivalesco rumo a um som cada vez mais leve e talvez de raiz. Sem dúvida os dois primeiros álbuns traziam elementos sonoros que de algum modo remetiam aos carnivals americanos, seja pelo uso de dissonâncias harmônicas, seja pela estranheza causada pela desarmonia melódica da banda. Mas também eram capazes de fazer bastante barulho:
Para se convencer da angústia dos andarilhos, retomada ainda no segundo álbum, deve-se ouvir a música mais desesperadora da banda, No Christmas While I’m Talking de Bows + Arrows (2004):
A tristeza aos poucos vai dando lugar a resignação e serenidade, e se tem uma canção de despedida como I Lost You, também do álbum de transição You & Me:
Até que, por fim, se chega a Heaven (2012), aprofundando Lisbon (2010), que já indicava uma nova direção. Então não se é mais o Duke of Earl, como em We Can’t Be Beat, em que se explora o som acústico de um violão choroso com o contraponto das velhas guitarras em sua “desarmonia melódica” (sob backing vocals harmônicos à la Bee Gees em sua fase Brit Invasion), chegando a uma balada de tipo Fleet Foxes:
Não é mais preciso então recorrer ao álcool para suavizar uma angústia existencial que se dissolve ao nascer dos filhos.
[popup_anything id="11217"]