Era um rato na calçada, à porta da minha casa. Era bem moço, uma criança. Chegando perto, vi que ainda era vivo! Respirava com dificuldade e se arrastava diante de mim. Lembre-me, eu o havia atingido com um pedaço de tijolo na noite anterior. Estava assentadinho no fogão à lenha, não imaginava por certo que sua existência me incomodava, menos ainda que nem mesmo eu soubesse dizer por quê…
E agora aquilo, parecia me afrontar em tanto querer viver. Algumas pessoas têm mesmo essa compulsão estranha pela vida, e essa presunção em demonstrar. Não podia deixar aquele miserável ameaçar a integridade de minha família! Não são eles que nos trazem a peste negra?! Não sei bem sobre doenças, mas com um nome desses não há de ser coisa boa, claro que não.
Tratei de buscar uma arma. Ainda bem que qualquer arma é legal para se executar indefesos. Achei uma pá. Chegando perto, eu o peguei com ela, deu um gritinho de criança desesperada, subiu, buscando o céu… e caiu no chão de altura suficiente.
Suspirou fundo ainda, abriu os olhinhos. Como tudo quer sempre viver! Mas eu tinha de matá-lo! Atirei-o na vala comum. Espremi-o até sufocar aquele ar. Enterrei e saí para o trabalho.
No caminho, porém, o crime higiênico pesava sobre mim, eternamente. Aquele ar que lhe tirei, a dor que lhe causei, aquela idade subtraída… Dói demais ainda em mim! Coisa de “mulherzinha” talvez, de “maricas” que só quer ficar em casa, fugindo do vírus e dos vermes, das pessoas e desses contatos todos, querendo como que nos lembrar do que todos sabemos! …
Minha incompetência para matar é total. Mas haverá gente melhor nisso. Militares, cristãos, presidentes de repúblicas nunca achadas, genocidas,… “homens” sem nação. Bem diferentes de mim… Bem diferentes de mim.
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