Cada vez que um trabalhador vira a catraca…
Só por R$20 centavos? Não! Como diriam as pensadoras modernas “As meninas” – “O de cima sobe, e o de baixo desce…”
Segundo o museu dos transportes, foi em 1872 que se iniciou a operação de bonde com tração animal em São Paulo, para facilitar a locomoção das pessoas pela cidade.
Nove anos mais tarde, foram construídos bondes que ligavam o bairro da Liberdade à Santo Amaro, e em 1893 a expansão do serviço exigiu outras providências, quando foram implementados passes pelo Poder Público, unificando a cobrança do transporte pela Companhia Carris e pela Viação Paulista.
A princípio, em 1896 dois grandes empreendedores, Antônio Guacho, vindo do Canadá, e Antônio Augusto de Souza iniciaram acordos para formar uma primeira empresa de transporte a base de eletricidade.
Assim, em 1897 a Câmara Municipal liberou uma concessão de operação de serviços a estes empresários particulares, concessão que já se iniciou com o prazo de 40 anos.
Antônio Guacho foi buscar investimentos no Canadá para o projeto, conseguindo autorização para a empresa Canadense The São Paulo Railway, Light & Power Company Ltda atuar no Brasil.
Desta forma, fica claro que desde o final do século XIX não só nos transportes, mas em tantos outros pontos, o imperialismo estrangeiro já se acentuava em nosso país.
Foi preciso intervenção de atores sociais externos para expansão econômica brasileira, e em nenhum momento o transporte foi realmente público, uma vez que desde o início foi dado a uma empresa canadense a concessão de 40 anos de transporte em São Paulo.
Mas o que isso significa na prática?
Concessão de serviço público consiste em acordo de vontades entre a Administração Pública e um particular, onde a Administração transfere ao particular um serviço público, para que este o exerça em seu próprio nome, por sua conta e risco, mediante pagamento de tarifa pelo usuário, conforme explicação da professa Maria Sylvia Zanella Di Pietro.
Até hoje todas as linhas de ônibus de São Paulo são operadas por concessionárias e supervisionadas pela São Paulo Transportes S.A – SPTrans, municipal autárquica criada em de 1995.
Apesar de São Paulo possuir uma das maiores frotas de transporte público do país, são poucos os particulares que se beneficiam das concessões. Poucas famílias ficam no controle das concessionárias, o que é o caso da família Ruaz, de José Ruas Vaz, português naturalizado brasileiro e “dono” de 50% do transporte público da capital.
Quando a SPTrans foi criada, em 1995, a tarifa de ônibus em São Paulo era de R$0,65.
Aumentou ano após ano, chegando a R$1,00 em 1998, R$2,00 em 2005 e R$3,00 em 2011 na gestão Serra / Kassab. Mas foi na gestão Haddad em 2013, com o aumento da passagem para R$3,20 que São Paulo encarou sérias manifestações, fazendo a prefeitura recuar do aumento que só durou entre 02/06/2013 a 24/06/2013, quando voltou a custar R$3,00.
De 2013 para 2018 estamos, agora, frente a um novo aumento, pagando atualmente R$4,00 em nossa passagem.
2013 foi “só pelos R$0,20 centavos”?
Quem mais sofre com o aumento da passagem é a população trabalhadora e periférica.
Quem mora nas periferias precisa do dinheiro da passagem para chegar ao centro, e é no centro que fica o lazer, os estudos, o trabalho, a maioria dos hospitais…
Quem vai sair no final de semana para ir ao Teatro, por exemplo, não gasta apenas o preço do ingresso da peça. Gasta com o ingresso + R$4,00 ida / R$4,00 volta, com integração de trem / metrô vai pagar R$6,96 ida / R$6,96 volta. Isso se conseguir pegar os ônibus / Trens e metrôs em menos de duas horas, para dar a integração.
E porque não conseguiria?
Nem sempre a população consegue subir no ônibus.
Nem sempre consegue embarcar no vagão do trem.
Tudo pode acontecer quando você tenta embarcar nos transportes de São Paulo, ao ponto do absurdo de um trem parar no meio da via e fazer os passageiros desembarcarem arriscando suas vidas andando a pé entre as estações. Para quem mora nessa grande capital isso é até mesmo cotidiano.
Portanto, quem é trabalhador sabe do tormento diário, da violência psicológica que passamos para trabalhar, do aperto, do desrespeito, ou seja, no fim pagamos para as famílias ricas “donas” do negócio lucrarem em cima do nosso sofrimento.
Começamos pagando para os Canadenses, e hoje pagamos para os Portugueses. Nem sequer pagamos para a elite nacional (o que por si só já seria ruim). Na maioria das vezes pagamos para a elite internacional que lucra em cima de nosso trabalho e do nosso esgotamento físico e mental.
Quem está lucrando quando você dá um “passinho para trás?”
Quem lucra quando você se aperta para virar a catraca?
Primeiramente, está na hora de nos indignarmos.
Não vamos mais dar o “passinho para trás”.
Vamos dar as mãos, e dar os passos à frente.
Vamos fazer isso não por “R$0,20”, mas por nossa dignidade enquanto trabalhadores.
Porque precisamos dar o primeiro passo para os trabalhadores da periferia terem acesso ao centro, então os jovens possam dar tantos outros passos à frente depois de nós.
Tanto o Governo do Estado (responsável pelos trens, metros) quanto a Prefeitura Municipal (responsável pelos ônibus) aumentaram a tarifa.
Afinal, não é de hoje que sabemos que nosso prefeito não está preocupado em saber se além do estudo formal os estudantes estão sendo educados criticamente.
Nosso atual prefeito limitou o passe livre dos estudantes, de forma que tenham acesso apenas ao estritamente necessário para ir à escola / faculdade e voltar. Não se preocupa com trabalho, cultura, lazer….
Afinal, em seu pensamento: Porque gente trabalhadora e periférica precisa de lazer?
Nem mesmo de comida precisam, se não tem pão, que comam ração…
Como prova disso as escolas municipais já tiveram cortadas suas brinquedotecas e suas salas de leitura.
Parece que quanto menos pensamento crítico for dado aos filhos dos trabalhadores, “melhor”. É assim que a prefeitura vai minando o direito da juventude de pensar.
Vai minando o acesso à culturatão importante para o desenvolvimento pessoal de qualquer pessoa.
Para Dória, em suas palavras: “O lazer é complementar, é importante, esporte é importante também, mas o importante é educar”.
Que tipo de educação é essa, que restringe, que oprime, que não incentiva a pensar?
Certamente, educação real só existe para os filhos dos ricos, que tem acesso aos museus, aos bons livros, as boas peças de Teatro …
Á nós, trabalhadores, o que resta?
Por isso, resta não dar o “passinho para trás, para liberar a catraca”.
Resta o direito à cidadania e à manifestação, enxergando tudo o que o aumento da passagem significa em nossas vidas.
Pela qualidade do transporte público, por nossa qualidade de vida. Porque merecemos respeito!
Finalmente, daremos um passo à frente.
“Todavia, prossigamos! Seja de que maneira for! Saímos a campo para uma luta, lutemos, então! Não vimos já como a crença removeu montanhas? Não basta então termos descoberto que alguma coisa está sendo ocultada? Essa cortina que nos oculta isto e aquilo, é preciso arrancá-la!” (Bertolt Brecht)
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