Conto: Gabriel Lima | Ilustração: Filipe Rocha
Contos Ilustrados: Abraçaço
Há tempos não havia tanto movimento na Rua das Olivas. Na altura do número 102, lá pelo 5º andar, o vento balançava sem receios o vestido de Pâmela, que aparentava estar mais decidida do que realmente estava. O parapeito parecia ter sido feito na medida exata de seus pezinhos trêmulos e sua mão esquerda ainda era forte o bastante para segurar no batente da janela, garantindo a volta para dentro do quarto – caso mudasse de ideia.
Lá de cima Pâmela conseguia ver claramente a coleção de curiosos na frente de seu prédio – garotos apontando, correndo e chamando mais garotos; senhoras com a mão na boca ou no peito; gente cobrindo e descobrindo os olhos. Não eram muitos, porém mais do que Pâmela gostaria que estivessem ali. Avistou também, pouquíssimo tempo depois, um carro de polícia parar no meio da rua e dois policiais se aproximarem. E, por fim, viu Mauro, com uma caixa nas mãos.
As lágrimas que lhe embaçavam os olhos não a impediram de reconhecer seus pertences na caixa. Sua boca seca sentiu o gosto da ironia quando olhou o relógio e notou a pontualidade de Mauro. 8 da manhã, em ponto. “Para me pegar em casa, ele nunca foi tão pontual”, pensou, ainda ouvindo vozes misturadas vindas da rua. O bicho de pelúcia, o porta-retratos, a coleção de CDs do Caetano e outras quinquilharias; tudo estava jogado de qualquer jeito na caixa.
Assim que Mauro dobrou a esquina e percebeu aquela gente olhando para cima, logo levantou o olhar também e reconheceu em um segundo o vestido, a janela e o perigo da situação. Sentiu uma carga elétrica passar pela espinha quando percebeu que os dedos de Pâmela já escapuliam para fora do parapeito. Sabia que aquilo tudo era mais uma atitude inconsequente, causada pelo término entre os dois – que havia ocorrido na noite anterior.
Mauro mediu mentalmente a larga distância entre ela e o chão, e só teve tempo de largar a caixa pesada no chão e estender as mãos pedindo para Pâmela não se jogar. Pâmela, por sua vez, percebendo o gesto, num impulso, conseguiu o que queria: seguir em frente e ir direto para os braços de seu amado.
Mauro deu um passo para trás.
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