A pandemia e a impossibilidade de abrir o parque forçaram a mantenedora do espaço a anunciar redução de 50% no pagamento de professores e alunos da Escola do Auditório do Ibirapuera
Se você não conhece o trabalho que a Escola do Auditório do Ibirapuera faz, não sabe as oportunidades que perdeu de assistir à estudantes de escolas públicas tocando ao lado de grandes nomes da música brasileira de forma genuína.
A escola apresenta uma oportunidade nova para centenas de jovens dentro da cultura, encontrando na música uma resposta para os problemas enfrentados em espaços comumente carentes, através de uma bolsa auxílio que permite se viver estudando música a partir dos 12 anos de idade.
Com aulas diárias, a Escola de Música do Auditório conta com o Coro da Escola do Auditório, Orquestra Brasileira do Auditório (OBA), Orquestra Furiosa do Auditório (Furiosa) e Obinha –, sob a regência de Nailor Proveta (diretor artístico), Débora Gurgel (coordenadora pedagógica), Fi Maróstica (regente da Obinha) e Daniel Reginato (professor de percepção melódica).
Entre os grandes nomes da música brasileira que já tocaram ao lado dos jovens estão Toquinho, Chico César, Jards Macalé, Fabiana Cozza, Xênia França, Marcelo Jeneci, Tiganá Santana, Ceumar, entre outros.
Diminuição das atividades durante a pandemia
Com aproximadamente 140 estudantes e 30 professores, a Escola do Auditório do Ibirapuera anunciou ontem (05) internamente que, entre a escolha de fechar a escola por tempo indeterminado e fechá-la, decidiu-se em cortar 50% das atividades, afetando os salários dos professores e bolsas de auxílio aos estudantes.
Quem tomou esta decisão foi a Construcap, em nome de Urbia Gestão de Parques, que atendeu a exigência de assinatura do contrato de concessão durante a gestão do prefeito João Doria. Segundo os representantes da gestão, a empresa está buscando patrocinadores para a escola continuar funcionando plenamente.
De acordo com a concessionária, a impossibilidade de atividades nos parques foi decisiva para o corte das verbas. Desde que assumiu os projetos, a Urbia sofreu com as medidas restritivas impostas pela pandemia de covid-19.
O que a privatização do Ibirapuera tem a ver com isso?
A empresa responsável pela privatização do parque é a Construcap CCPS Engenharia e Comércio, que venceu a licitação pagando a outorga fixa de R$ 70,5 milhões pelos 35 anos de concessão – o valor mínimo da outorga fixa era de R$ 2,1 milhões.
O contrato foi assinado em 20 de dezembro de 2019, e desde lá a Escola de Música do Auditório passou por mudanças nos processos de adequação pela Urbia, que estava montando a equipe cultural que integraria a gestão do projeto.
Antes da Urbia, quem cuidava da escola era o Itaú Cultural desde 2011, numa gestão compartilhada com a prefeitura de São Paulo, sem apoio de leis de incentivo. Com o contrato finalizado em junho de 2020, foi a partir de julho que os alunos e professores ficaram sem receber pagamentos que estava a cargo da Prefeitura de São Paulo.
Neste período a Escola do Auditório do Ibirapuera passou por uma breve gestão da Prefeitura de São Paulo e também contou com propostas do Instituto Baccarelli, mas manteve-se sob gestão da Urbia Gestão de Parques, que assumiu a escola integralmente em 20 de outubro de 2020.
Os pagamentos aos alunos e professores da escola foram retomados em dezembro de 2020, com valores retroativos dos meses em que ficaram sem remuneração. Mas neste momento anunciam um novo corte nas verbas sem previsão de retomada das atividades integrais por falta de verba, diante da impossibilidade de abrir os parques e espaços culturais.
A luta de professores dedicados
No período em que a Urbia Parques ainda estava se habituando com os processos da Escola de Música do Auditório, e também no momento em que a pandemia apresentava dias de insegurança sobre quanto tempo ainda ficaríamos em isolamento, quem tomou as rédeas foram os professores e os alunos, que mantiveram as aulas com recursos próprios.
Na última segunda-feira, durante a reunião direcionada a professores, alunos e pais de alunos, a Urbia Parques anunciou que a decisão da diretoria teria sido de suspender as atividades, mas Amador Longhini, Debora Gurgel e Camila Lordy, responsáveis pela coordenação das atividades pedagógicas, propuseram uma diminuição para metade das atividades, afim de impedir a evasão completa dos jovens.
Entretanto, já durante esta reunião houve dúvidas sobre a necessidade de se procurar empregos fixos ou “bicos” para complementação de renda. Mesmo com um valor não muito alto de bolsa auxílio, a remuneração dada para os jovens músicos permite que eles possam se dedicar aos estudos. Entretanto, num momento de pandemia e altíssimo desemprego, estes estudantes com formação cultural correm o risco de serem empurrados para subempregos e guardar seus dons no bolso, por tempo indeterminado.
Escola do Auditório do Ibirapuera
Sediada numa das obras arquitetônicas mais recentes de Oscar Niemeyer, projetado nos anos 50 e construído em 2005, a Escola do Auditório do Ibirapuera tem a oportunidade de estar em uma das casas de show mais importantes da cidade de São Paulo. O saguão conta com escultura de Tomie Ohtake.
Os processos seletivos eram feitos para jovens com 12 ou 13 anos de idade, no período vespertino ou matutino, sem conhecimento prévio em música, cedendo uma bolsa de R$ 200 reais, mais vale-transporte, com possibilidade de ampliação do valor ao entrar na Furiosa, formação mais experiente da escola. Também há a possibilidade de se candidatar para ser um jovem batuta, que atua como auxiliar de professores e recebe um valor adicional.
A comissão de seleção é formada pelos professores da casa que avaliaram o interesse do candidato no estudo musical, além de sua musicalidade. O curso tem duração de cinco anos e é dividido em dez semestres. O aluno escolhe um instrumento quando estiver apto para iniciar o segundo semestre do curso, de acordo com seu rendimento e a disponibilidade da Escola.
Com a nova decisão, ecoa na mente o trecho vencedor do Festival de 1967, de Edu Lobo, “quem me dera agora eu tivesse a viola pra tocar”.
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