Vivenciar os infinitos prazeres que nos levarão a possíveis desgostos. Essa parece ser a verdade absoluta. Mas são tantas as verdades…
E os cafés-da-manhã, são eles tão fartos quanto os que vemos nos comerciais e novelas?
Enquanto alguns jovens cujas vestes ultrapassam o rendimento de muitas famílias brasileiras, enfileiram-se para exibirem às câmeras o preço de cada peça de seus tecidos etiquetados – diga-se de passagem que uma renda per capita mensal de mil e quinhentos ‘fora temer’ não ultrapassa o valor concernente à indumentária de marfim dos ‘‘meninos-memes’’ – outros se transformam em malabaristas prateados os quais faltam meias nos pés e meios para salvarem-se da exposição à fuligem, aos raios ultravioleta e às buzinas.
Sim, essa é a sina aparente: uns são despretensiosos, despojados (me permito inferir o termo “ociosos”) os outros assistem seus sonhos, constantemente, sendo assassinados em troca de trocos. Sonoras são as buzinadas…
Ironiza-se um, compadece-se de outro, mas a conta não fecha no final. Esse quiproquó continuará aqui, ali, acolá… Colocaremos vendas rasgadas nos olhos, taparemos o sol com a peneira e tudo bem? Como lutar por classes se as barreiras impostas ao longo do desenvolvimento tecnológico nos forçam a rodar em torno de nós mesmos centripetamente?
A moeda de troca é o reconhecimento em forma de polegares opositores apontados para cima.
Você é o que você tem?
A prática do consumo a qualquer custo intoxica, financeira ou energeticamente. A autopromoção é uma das camadas de nossa personalidade carente, que busca segurança e aceitação. A sociedade é plastificada. O aparelho digestivo dos animais marinhos, comedores de embalagens e outras formas de ‘não vida’ provinda de um descarte humano, está sendo. Tão breve, haverá escassez de recursos primários; as novidades serão reformulações de ideias já superadas. Faltará água, mas haverá fartura de novos talentos…
Nada sobrepuja a conveniência do pertencer.
Somos incentivados ao delírio do novo, da inovação, não é mesmo? Está claro que o argumento do ‘novo’ faz parte das obviedades do discurso, isso não é inédito. Observa-se, no entanto, que temos (e teremos cada vez mais) infindáveis opções de escolha: modernas no que se refere ao registro histórico vigente e aprazíveis por serem elas, somente, utilitárias – um brinde aos publicitários da modernidade.
A pluralidade de quereres e de necessidades criadas a partir da ausência de critério, que seria razoavelmente adquirido caso houvesse investimento concreto na básica área da educação, é uma constante em pleno avanço. A indústria corporativa capacitou-se a organizar e a listar, em blocos de contexto, nossa emergência domesticada de consumo. Tudo bem, eles nos dão os meios, mas desde que tenhamos as condições mínimas para entrar nesse jogo.
E os ouvidos buscam vozes
Um bilhão de vezes vistas à custa de banda larga e 3g, fama e ascensão impressionantes; essa é a realidade de um corpo social que privilegia a futilidade dos assuntos cotidianos e que são expostos de forma jocosa a visar somente o entretenimento; o espetáculo que causa a polêmica desorienta e segrega dicotomicamente os seres engajados em suas causas próprias. Os cronistas do agora são comediantes e políticos fanfarrões, em sua maioria? Desculpem-me os acadêmicos, mas parece que sim. A eloquência de um Dr. Enéas Carneiro era muito superior à pobreza linguística e postural de uma liderança cujo fã clube é arrebanhado por meio de chavões anacrônicos e falas imperativas de maldizer – a presença daquele, por mais controversa que fosse, ao menos tornava o pleito um pouco mais categórico. O riso, por sua vez, é o melhor dos remédios; logo, suponho que somos uma sociedade deveras adoecida…
Mas a vida sorrirá novamente: camisas amarelo-canário serão vendidas aos montes, a seleção de futebol trará a taça para casa, as verdades serão seletivas e nossos sonhos, pré-fabricados. A década de 70 não será representada somente por roupas e músicas de um underground empobrecido de sentido… O problema da apatia, é que ela fragiliza o indivíduo e o torna marionete da ocasião.
O cocar do índio foi trocado por uma camiseta do flamengo. Seu cachimbo da paz foi escambado forçosamente; em troca, lhe deram um copo de cachaça e um maço de cigarros. Pavimentaram a mata e chamaram-na de rodoanel. A cada buzinada, três pássaros morrem do coração. Uma cobra foi atropelada saindo do meio fio, a placa sinalizadora de tráfego tem furos de pistola. Pouco vejo falar na Onça. No entanto, o nome de Jair não sai da boca do povo. ‘’Falem bem ou falem mal, mas falem de mim’’ – não é esse o ditado? Pois bem, ele não gosta de indiozinhos nem de nada do que é bonito de se falar nos miolos sociais. E quando a verdade das urnas mostrar que nossa próxima liderança política será um fantoche de cabelos bem penteados? E quando houver a vitória dos SUV’S?
Infinitos Prazeres? Não, O purgatório já é aqui.
As igrejas ainda anunciam a compra de um lugar no céu? Pois parece que ele já está sendo adquirido por meio do mercado imobiliário, diretamente. Tenho quase certeza de que a sacada gourmet foi invenção bíblica: lá a carne Friboi é assada e o vizinho de cima não é convidado. A torre de babel desaba e o país chora. Bem vindos à expansão populacional.
Dizem que por falta de um grito perde-se uma boiada. Talvez sejamos nós esses bovinos que fingem ter vontade própria, indolentes e anestesiados pelo excesso de mentira que é colocada em nossa alimentação. Perdidos entre o salitre e o conservante, seguiremos confiantes no destino que é mostrado através de notícias e pesquisas falsificadas. Quando o fogo chegar a esse circo social, o palhaço morrerá afogado nas lágrimas de seu riso, os bufões de cara limpa estarão ocupados arquitetando sua próxima piada, os outros… Bom, cada um será por si, e as mães continuarão sendo todas iguais.
Se todas as mães são iguais, não há algo de errado nisso?
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