Dizem que o samba nasceu na Bahia. Se isso é verdade não sei, mas uma coisa é certa: o samba baiano não perde para o samba carioca quando o quesito é qualidade. São inúmeros os sambas feitos por gente de lá, que atestam uma poética rica embalada pelo característico batuque afro-brasileiro. Um dos baluartes do samba da Bahia é o cantor e compositor Ederaldo Gentil.

Soteropolitano, relojoeiro de profissão, nascido no dia 07 de setembro de 1943 e criado no bairro do Tororó (até então o reduto do carnaval baiano), Ederaldo foi um legítimo representante da melancolia ritmada. Sabia como ninguém transformar as amarguras da vida em beleza poética e as picuinhas do cotidiano em sabedoria popular.

Ederaldo Gentil

Autor de versos rebuscados, carregados de metáfora, foi um dos maiores poetas populares da história do Brasil. Porém, como tantos outros artistas, caiu no ostracismo, tanto que sua morte, no dia 31 de março de 2012, quase passou despercebida pela grande mídia. Hoje, até mesmo nas rodas de samba, é pouco conhecido.

Além de renegado pela mídia, Ederaldo Gentil foi também um injustiçado pela indústria fonográfica. Apesar de ter suas composições gravadas por grandes nomes da MPB, como Gilberto Gil, Clara Nunes, João Nogueira, Jair Rodrigues, Elza Soares, Beth Carvalho, entre outros, Ederaldo gravou ao longo de sua carreira apenas três LPs, sendo que o último foi custeado por conta própria.

Principal nome do carnaval baiano desde o final da década de sessenta, gravou seu primeiro disco, Samba, canto livre de um povo, somente em 1975, pela extinta gravadora Chantecler. Um ano depois, lançou seu segundo álbum, Pequenino. Contrastando com a qualidade de suas canções, os dois primeiros discos obtiveram pouco sucesso comercial, resultando na decisão por parte da gravadora de não lançar novos trabalhos do sambista.

Frustrado com a apatia das gravadoras em relação às suas obras, Ederaldo resolveu tirar do próprio bolso o investimento para a gravação de um outro álbum. Contando com a ajuda de amigos músicos, conseguiu finalizar o LP Identidade em 1984.

Infelizmente, o disco não trouxe o retorno esperado e Ederaldo Gentil foi gradativamente sendo empurrado para a margem do meio artístico musical. Apenas em 1999 é que o nome do sambista seria grafado em um álbum novamente. Seu parceiro Edil Pacheco reuniu diversos artistas, organizou e produziu o CD Pérolas Finas, feito em sua homenagem.

Por fim, em 2006, quinze músicas foram escolhidas para integrar a coletânea: A voz do poeta, que foi produzida por amigos, admiradores e familiares de Ederaldo. Assim, sem o merecido reconhecimento, Ederaldo Gentil viveu até o fim de sua vida, seguindo a sina dos poetas, vagando pelas esquinas da ilusão, transformando o sofrimento em beleza, para depois morrer sem glória.

Como ele mesmo diz na canção Provinciano: “São das dores do mundo que fazemos os alicerces do viver”. Essa frase resume a obra de Ederaldo Gentil: ele fez da dor a matéria-prima dos seus versos. Porém, esse sentimento de tristeza que permeia os três álbuns da carreira do poeta baiano não advém de uma tristeza estéril, mas, sim, de uma tristeza carregada de esperança, que inspira, que nos arrebata para o instante eterno da poesia e nos deixa mais feliz.

 

Ouça os discos:

1975 – Samba, canto livre de um povo  É o seu disco de estreia. A canção que merece maior destaque desse álbum é O Ouro e a Madeira. Considerada por muitos o maior samba de todos os tempos, o refrão é uma metáfora genial, que nos faz refletir sobre a soberba: “O ouro afunda no mar/Madeira fica por cima/Ostra nasce do lodo/Gerando pérolas finas”.
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1976 – Pequenino  Lançado em 1976, seu segundo disco tem a mesma carga de melancolia do primeiro. Porém os versos profundos e reflexivos são acompanhados por um batuque mais africano. É nesse disco que se encontram alguns sambas-enredo que Ederaldo fez para as escolas de samba de Salvador.
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1983 – Identidade – Disco independente de 1984, conta com canções esplendorosas como:

05342635 é o meu número, o meu nome, minha identidade

Mínimo salário é o meu ordenado

12 horas de trabalho

Que felicidade, que felicidade

Coberta de lã não aquece o frio que vem da saudade

Chave de ouro não abre a porta da felicidade

Tempero nenhum mudará o doce sabor da afeição

Como também guerra fria não vence o calor da paixão

Das minhas mãos aflitas fiz a paz mais pura

Do meu canto tristonho fiz um rouxinol

Mas acabou meu sonho a vida veio dura

Eu vi que um sol maior não é um tom menor

 

1999 – Pérolas Finas  Produzido por Edil Pacheco, reúne diversos artistas interpretando sambas de Ederaldo Gentil.
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2006 – A Voz do Poeta  Coletânea produzida por amigos, admiradores e familiares de Ederaldo Gentil.
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