As lutas populares e a esquizofrenia da grande mídia
As manifestações se seguiram Brasil adentro na última semana, principalmente no dia da Greve Geral, quinta-feira, 11. Os protestos deram uma nova e revigorada chacoalhada na política nacional, que continua a operar a toque de caixa por mudanças.
Novamente com uma pauta definida, o povo foi às ruas e quebrou a postura complacente da mídia em relação às manifestações. Jornais, revistas, rádios e televisões pareciam ter esquecido o mês de junho. Era como se os eventos do mês passado tivessem se passado em um país distante, muitos anos atrás.
É saudável que as manifestações voltem a colocar em oposição mídia e protestantes. Assim, a população pode levar a cabo suas reivindicações legítimas, que são o oposto ao que querem os donos da mídia e todo o clube social que representam. O brasileiro deve entender os problemas deste país e as soluções que estão sendo apresentadas e se esquivar das artimanhas do grande empresariado, que joga contra qualquer balanço de estruturas que a sociedade venha a experimentar.
No texto de hoje, são explicados os assuntos redução da jornada de trabalho, terceirização e investimentos na Saúde, temas abordados nas ruas na última semana.
Redução da jornada de trabalho
O Congresso (senadores e deputados federais) tem em mãos o projeto de lei que prevê a redução da jornada de trabalho de 44 horas por semana para 40 horas. A chamada PEC 231/95 prevê que o tempo de serviço semanal seja reduzido sem impacto no salário, além de aumentar o valor do adicional da hora extra de 50% para 75%.
O parlamentar criador da PEC, Inácio Arruda (PCdoB/CE), aponta que nos últimos 20 anos o avanço tecnológico permitiu aumento da produtividade e dos lucros, beneficiando as empresas, mas não os trabalhadores. O líder do partido de Arruda na Câmara, deputado Daniel Almeida (BA), alegou ainda que a redução da jornada de trabalho pode ser importante mecanismo de combate à crise econômica, já que abre milhares de vagas de trabalho.
Acima dos interesses do mercado, porém, está o do trabalhador, que tem necessidade de mais tempo para dedicar à sua família e suas atividades diárias, além de poder se qualificar profissionalmente. Hoje, os trabalhadores gastam, em média, quatro horas para se deslocar da casa para o trabalho e vice-versa todos os dias. Por vezes, a carga de trabalho chega a 12 horas diárias. Ao mesmo tempo em que cobra resultados e aperfeiçoamento no trabalho, as empresas tiram o tempo, a energia e a possibilidade do trabalhador se dedicar a atividades educacionais.
O tempo médio de trabalho semanal do brasileiro – de 40,9 horas por semana – está muito acima de economias como da Alemanha e da França, com suas 38 e 35 horas semanais respectivamente, países que estão entre as 25 melhores educações do mundo. Em contraposição, a Coréia do Sul, a segunda melhor educação do mundo, emprega sua mão de obra por 55 horas semanais em média, mas tem o maior índice de suicídios do mundo. Se a educação sul-coreana é digna de elogios, por outro lado, a precariedade do trabalho deve ser condenada. De que vale o aprimoramento da economia ao custo do esfacelamento do ser humano?
Voltando ao Brasil, dados do DIEESE apontam que, além do alto número de horas trabalhadas normalmente pelo brasileiro, 40% da força de trabalho nacional faz hora extra. Indo mais a fundo nos números descobrimos que um em cada três brasileiros trabalha 44 horas por semana e um em cada cinco mais de 50 horas semanais, quinze horas a mais que a França e apenas cinco horas a menos que a sociopata economia sul-coreana.
Fonte: Senado, Assufrgs, Força Sindical, Superinteressante
Veto ao avanço da terceirização
A terceirização cresceu muito nas últimas décadas. O número de trabalhadores terceirizados ultrapassa 20% do total de empregados com carteira assinada no país. Tornou-se o modelo de trabalho para as empresas modernas que visam reduzir o custo de produção e aumentar a lucratividade.
Essa modalidade de trabalho proporcionou ao empresário contratante uma redução de despesas. Essas reduções são pagas pelo trabalhador, que recebe menos em seu contracheque de funcionário terceirizado. Ao mesmo tempo, as empresas desse setor representam um mercado de R$ 43 bilhões por ano no Brasil.
Além da redução dos salários, essa manobra corporativa resulta na precarização das condições de trabalho, aumentando a jornada de trabalho, a alta rotatividade e o número de acidentes e doenças ocupacionais.
Um projeto de lei que está no Congresso em situação adiantada pretende ampliar o alcance dos trabalhos terceirizados na economia nacional. Por esse motivo, o projeto se tornou outro ponto importante na reinvindicação dos trabalhadores e unanimidade na pauta dos sindicatos na Greve Geral do dia 11 de julho.
A proposta de lei 4.330/2004, de autoria do deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), chamada de Regulamentação da Terceirização ou PL 4.330, permitirá que a empresa terceirize todos os setores, ou seja, sem funcionários contratados diretamente, e ainda extinguirá a própria responsabilidade, caso a terceirizada não cumpra as obrigações trabalhistas.
Atualmente a terceirização é controlada devido à Súmula 331 do TST, que só permite a terceirização em atividade-meio (alguns setores) da empresa. Mas a PL 4.330/2004, que está em tramitação na Câmara dos Deputados, pretende acabar com esses limites, incitando a prática de terceirização de forma indiscriminada, possibilitando que a empresa atue sem trabalhadores contratados diretamente.
Além da precarização do trabalho e dos salários, o projeto de lei implicaria no enfraquecimento das lutas sindicais, ao repartir os grupos de trabalhadores em porções cada vez menores. “Num dos artigos, o Projeto de Lei propõe que a representação sindical dos terceirizados seja feita pela função que o trabalhador terceirizado exerce. No caso dos bancários, eles estão sugerindo que haja sindicato para caixas, para vendedores de seguros, para cada uma das funções. Isso representa não só a precarização do trabalho, mas a pulverização da luta e, por consequência, o enfraquecimento da organização dos trabalhadores”, disse o advogado trabalhista Antônio Carlos Maineri ao site da CUT.
Fonte: CUT, Força Sindical, TVT
10% do Orçamento para Saúde
O “Movimento Nacional de Defesa da Saúde Pública” foi criado em 2012 com o intuito de coletar assinaturas para aprovar o Projeto de Lei, de iniciativa popular, que permite a destinação de 10% do orçamento da União à Saúde. Se a proposta fosse aprovada agora, o aumento nos investimentos passaria dos R$ 40 bilhões.
No Brasil, a carência de investimento dos governos em Saúde Pública e o fortalecimento do setor privado gerou o que é chamado de mercantilização do sistema. A questão se estende dos hospitais para os cursos de Medicina e vice-versa. Cerca de 60% das faculdades de Medicina são privadas. Em 2011, o MEC fechou 514 vagas em 16 cursos de bacharelado em Medicina e todas as vagas fechadas foram de entidades privadas, que estão seguindo a lógica da popularização de um ensino de baixa qualidade para atender à demanda do mercado. E mesmo assim não atende.
Enquanto isso, a população pobre sofre não só com a falta de qualificação dos profissionais, mas com a escassez de profissionais – qualificados ou não – e também com o sucateamento dos aparelhos públicas de saúde. Pessoas doentes em filas intermináveis, deitadas em lugares improvisados devido à falta de leitos hospitalares, escassez de recursos materiais e financeiros que interferem na realização de procedimentos são cenas comuns a qualquer pessoa que necessita de atendimento do SUS (Sistema Único de Saúde). Fora o atendimento precário, as pessoas também sofrem com a dificuldade de se chegar ao hospital ou ao posto.
Quando um dos problemas é atacado, outros se evidenciam. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, em entrevista a O Estado de S.Paulo, disse que 14 mil unidades de saúde foram finalizadas este ano no país e que 4 mil esperam por médicos para que possam ser inauguradas.
Dados do Ministério da Saúde apontam que, nos últimos cinco anos, embora tenha havido um aumento considerável no número de unidades de saúde e de equipamentos básicos, o número de leitos e de médicos formados não passou da casa dos 20%, para uma população que cresce exponencialmente. Já seria preocupante para um sistema eficiente. Para o caso do Brasil é alarmante.
Fonte: OAB, CUT, Operamundi, Força Sindical, Movimento Saúde +10, Instituto Salus
*Colaboraram neste texto Elaine Coutrin e Priscila Castilho
Fotos: Flávio Neves/Agencia RBS e Caio Marcelo/Agencia RBS
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